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Mostrando postagens de agosto, 2017

desordem n°2

isso tudo é uma grande invenção maluca e fora de ordem projetada com alguma graça em suas envergaduras é quase como se houvesse alguma dignidade santa nas extremidades do arquiteto um halo de luz que confunde que promete. até aquelas máquinas pesadas que circulavam os pesares do povo não eram também mais que uma fantasia simples, um intrincado jogo de abrir portas e deixar-se penetrar pelo rubi cravado em nossas têmporas. o rasgo do rasgo em forma de estrela que ilumina nossos dentes e nossas covas simulando sorrisos amarelos e melosos com a ideia de que sabemos que no fundo no fundo de nós é tudo uma enorme maluquice. uma desordem

coisas que movemos no escuro

a gente só precisa da gente mesmo do sol e de uma ou duas doses de coragem pra desafiar os penhascos deter os vulcões as calamidades atômicas provocar moinhos e batalhar contra cordas presepadas de todos os tipos e excessos sem nem ao menos capturar nem libertar a estrela andarilha do outro que cintila vestida de prata fina e tênue de delicadas camadas sob camadas, uma semi-joia de puro neon e brilhantina quem sabe talvez por um momento ligeiro seja nos permitido atravessar pelas brumas do dia, uma sombra um cisco um sopro por breves segundos de um pequeno dia à desaguar em nossas cabeças e tombar nossos joelhos, descansar os pés cansados em alguma praia de areia branca e inexplorada até mesmo brigar e romper e fugir com todas as armas, com todas as defesas todos os escudos brutos do centro do plexo para que talvez hoje ontem tenhamos a sorte e a sina de caminharmos descalços e nus limpos de qualquer vergonha semelhança

piras transcendentes

minha saudade é parecida com aquela coisa sem destino reto e uniforme que arrepia os pelos da gente e não da ás caras totalmente, não se desvela, só se mostra em pedaços flashes e giros, mil voltas contra o sol da minha vida, uma revolta armada sem bandeira de guerra, uma viagem violenta e cósmica no pontilhado alquímico dos dias de leão em vênus, um troço, um algo a mais largado no caminho do alvo, uma seta, um tombo, um traçado cru no asfalto frito, um rabisco asbtrato e amarelo sobre calçadas alpendres e prédios, minha saudade tem jeito de pássaro e um profundo gosto por céu.

crônicas marginais

gostaríamos de tecer lindos contos e poesias mornas sobre os atos de fé do bom homem, se houver algum ainda que o mereça de consciência limpa e cabeça erguida. eu não. ao contrário de lindos, são terríveis os causos da minha terra, todo dia um morre e outro sobrevive, porque demanda sobrevivência atravessar os tiros anônimos disparados na calada da noite e até de um punhado de coragem para disfarçar as tardes em que dançamos a ciranda indigesta das transações corrupitas dos animais políticos, seguros em sua ganância. meu deus como é difícil desviar da bala, dos cercos, dos inúmeros cacos maliciosos de lâmpadas que voam sem brilho de encontro ao amigo-irmão tão irreparávelmente só. como nós que resistimos na luta e na lida pelo pão nosso de todo dia e pela flor amarela que sobrevém a toda gente e nascerá sob o asfalto, entre os carros, mas hoje ainda só nos resta o lamento. de novo.

luminescência tempo.

tranço as tardes com a mesma calma que aqueles homens dizem homenagens ao santo burguês: tempo, que se foi, dizem até que fugiu, que evadiu pelas pontas dos dedos em uma serpente verde caolha à destilar veneno e vapor e recitar William Blake com a mesma voz embargada e soluço gemido que anjos aprovariam. e talvez à tenham aprovado mesmo, visto sua adoração pelas máculas, pelos pequenos equívocos, fragmentos caóticos mal-ordenados da juventude estonteante de cada um. cada qual o espelho que espelha a luminescência do risco de prata, das formas ousadas esculpidas pela graça de deus nosso-senhor-tempo-amém lapidadas na graça, no testempero imprevisível do diabo, deus-irmão da escuridão dos homens, de todos os homens e de todas as suas saudades .

aquilo que goteja

está pingando alguma coisa lá fora que me lembra você, que me lembra todas aquelas historias que você gostava de cantar baixinho quando achava que eu não estava escutando e eu estava, com certo desespero da sua voz confesso e braços abertos estendidos como uma toalha de retalhos, você produzia uma melodia tímida sobre o vazio das pessoas, um certo molhar-se que era bom, que humanizava as coisas de pedra, puff, de repente um poema de pestanas fechadas ou um risco morno que pinga, que goteja aquela sensação que gruda na pele até o osso, um óleo grosso que envolve a flor e o plástico e até o metal das moedas, alguma coisa lá fora pinga, pinga, pinga e me lembra você.

U T O P I A

um soluço, um depósito uma doação ilimitada de carga, de drama de momentos eternos pintados em simetria pelas paralelas ruas ambares do começo de noite, dos elevados monumentos históricos: uma lombada no tempo, um salto sem destino aparente. um lar dourado e frugal, onde todos os homens são santos e todos os dias são luminosos.

sereia do espaço

lança-me do barco se quiser, pedra na água, uma jóia submersa, sereia ensandecida em paetê e madrepérola, dignissima bruxa do mar interceptadora dos desavisados, santa santa dos mistérios aquáticos, guardiã dos portos, raio do veio de prata. segura minha mão, minhas escamas de peixe, vai ficando, escora tua mágoa no canto da sala, prova do odor familiar de especiaria antigas da tua pátria, tempero de lânguidos olhos, cova rasa na terra, uma brecha no fim, ventania cinza que se arma no norte, anúncio e trovoada, castigo na noite, naufrágio, afogamento e vastidão e eu mesmo já estou perdido.

notas ao tempo

te escrevo enormes juras grandes contratos selados pelas paredes do muro do teto da cabana que nos abrigamos ontem, quando havia risco no céu e ele transbordava e todas as ilhas se enchiam e todos os bichos humanos eram alagados e expostos, todo o ar era passageiro, só você permanecia ainda à estender os braços, pedir clemência, como se sozinho e nu pudesse salvar todo o pranto do mundo. e salvou.