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Mostrando postagens de janeiro, 2018

canto para minha morte

sua ausência desenha uma sombra sobre a cama, onde deito esperando minha morte e eu sei que ela vem, ela me chega todas as noites perto das três e parte sempre antes das luzes se acenderem, há margaridas murchas em seus cabelos, pinta no meu rosto um rastro de sal, come com seus olhos felinos e insones todos os afagos, esvazia de sentido as ruas desertas, as esquinas tão duramente cinzas choram por você então me veste de retalhos, fiapos de névoa, substâncias alquímicas que te amaldiçoam e te procuram, mas eu sei que você vem, eu sempre sei nos ossos quando você vem, abro as janelas para ver seus lábios repartindo um risco de riso que talvez também te ilumine. você, uma sombra solitária sobre a cama.

porta-estandarte

cruzam a ponte, os desassosegados, apressados, caminham pelo monumento sagrado em total desvaria, ávidos por um momento ardente que seja, que baste. sim, é meio-dia embebido pelas zilhões de saudades deixadas pelos nossos corpos-passageiros, os carros que trafegam em sentido colapso à nostalgia, bem-feito. mau-feito é o trânsito dos espíritos saudosos que se estrepam e se consomem no curso das esquinas. o porta-retratos, não guarda-chuvas. feat Julio Carvalho

cancioneiro do silêncio

cessaram as borboletas e os grilos, até as cigarras se calaram. nas estradas, nos beirais das sacadas, o que existe agora é só silêncio. lívido, cancioneiro de outros tipos de acorde, o tom natural das coisas feitas do vazio. apagaram-se também os vagalumes tristes, exaustos do brilho da sua luz e da solidão dos seus brejos, pousaram suas infinitas asas. não cantaram, não voaram apenas calaram-se.

chamado de carnaval

uma vez ao ano. quando a lua cruza à esquerda na fonte raios lunares penetram a terra, fecundam a noite. os grilos. os pirilampos, as mariposas grávidas recriam deus. e os homens espelhos que são. morrem-se de medo. de pavor. de clamor. uma vez mais um samba quente na mesa. outra vez. bendito o sol na moleira. e as doses inteiras. de cio. de amor. de carnaval rogai por nós pecadores e vem.

astrologias aparentes II

Intransponíveis diabos armados. santos portadores da divina luz do anjo sci-fi. avante! ao armagedom quimérico e tecnológico da inexatidão. prima caolha do ano da zebra psicodélica. isso, enquanto capricórnio balança suas duas cabeças. flecha. e sina. cruzam a roda. peixes está desfalecido. levado à correr por teus braços. uma cratera que se levanta. o bafo misto de quem vomitou estrelas virgens. que se ascendem. e não transcendem. de novo. o breu que lustra os crifres do touro. um único tiro que principia toda a manada. um vórtice temporal de leão à áries. um relâmpago lunar em meio de céu. que não afasta os caçadores. nem ludibria suas vistas.